quarta-feira, 6 de abril de 2011

FICHAMENTO: FUSCO, Rosário. Vida Literária. São Paulo: S.E. Panorama Ltda, 1940 (pp.214-221). Capítulo referente ao cronista João do Rio.

O autor chama a atenção para a importância de uma obra quando esta ultrapassa a geração em que foi produzida. Como ele ressalta, “a história da influência de um autor vale muito mais do que a história mesma de sua vida” (FUSCO, página 214). Assim, reavalia como o estudo de biografias são feitos. Ater-se a fatos é mais produtivo quando se avalia o quanto a produção de um autor paira sobre as gerações futuras, influenciando os demais mesmo após a sua morte. “Enquanto vivo, a sua proximidade exerce, sem dúvida alguma, uma espécie de ação de presença no tempo, controlando as opiniões dos seus contemporâneos. Depois de morto, só os reflexos do que criou, menos do que os reflexos do que viveu, como homem, importam.

Desta forma, o autor aponta que as biografias não contribuem para maior grandeza ou descrédito de determinados autores, visto que se limitam a um espaço de tempo específico. Não vai além, não nota a posterior influência nas outras gerações, de outras épocas. Após esse argumento, Fusco diz: “Morto, João do Rio continua passeando na sua saudade, uma presença de todas as horas no seu espírito” (FUSCO, página 215). Propôs inovações originais em seus textos, mesclando literatura e jornalismo nas páginas dos jornais e dos livros. Rosário Fusco ressalta a “pobreza” dos cronistas atuais, e justifica a rememoração a João do Rio como um ponto de referência essencial para assim fazer críticas aos contemporâneos (década de 40).

“(...) Ainda é uma deformação lamentável de João do Rio que lemos, diariamente, nos jornais de todo o país. (...) Esse mérito de inovador ninguém, que seja imparcial e honesto, poderá negar á memória de João do Rio. Foi ele, inquestionavelmente, o mais original, o mais vivo, o mais ágil e o mais saboroso cronista do Brasil” (FUSCO, página 216). Rememora e descreve “criaturas desgraçadas”, pessoas comuns, agentes que faziam parte do cotidiano da cidade, mas que muitas vezes não eram enxergados da maneira mais correta. Ao comparar cronistas, é válido destacar o que o autor fala a respeito de outro escritor da época. Elogiando, diz que “dos cronistas mais populares que temos tido (...), sem que, no caso, atentemos para o valor objetivo de cada um, (...) só mesmo o Sr. Rubem Braga conseguiu, escapar, talvez, em função de sua esplendida espontaneidade anti-livresca, à influência irresistível de João do Rio” (FUSCO, página 217). Sobre outro romancista (Jorge Amado), diz que “só consegue ser magnífico cronista pela virgindade de seu talento, absolutamente livre de quaisquer compromissos literários ou estéticos” (FUSCO, página 217), mas afirma que “no dia em que o Sr. Jorge Amado aprender francês deixará de ser o romancista ótimo que é, assim como no dia em que o Sr. Rubem Braga iniciar a formação de um lastro maior de erudição passará a ser (...) o mais desinteressante cronista do mundo” (FUSCO, páginas 217 e 218).

Defendendo João do Rio, sua originalidade e magnitude, enfatiza que “(...) se enganam todos aqueles que vêem, no extraordinário cronista da cidade, apenas um escritor de frioleiras mundanas ou um explorador pouco escrupuloso dos pequenos dramas das ruas e vielas, sacando deles o mais patético sensacionalista do que uma lição de humanidade que a vida nos fornece, diariamente, para a nossa ascensão ou para a nossa queda, no abismo das concessões mais deprimentes ou das renúncias mais espetaculares” (FUSCO, página 218). A preocupação de João do Rio era ser sincero em seus escritos, característica essa que possibilitou com que desbancasse grande nomes literários da época ao lançar seu livro de estréia, “Religiões do Rio”. Trabalho este, muito elogiado pelo IHGB, tornando o autor membro-correspondente desta mesma instituição.

A poesia estaria agonizando graças a banalidade dos poetas. Se ganha em quantidade, perde-se em qualidade. “a poesia, se quiser salvar-se, tem que falar em prosa. (...) o modernismo não fez outra coisa. E o que João do Rio escreveu há cerca de 30 anos passados é tão atual nos dias que correm que ninguém ousará desmenti-lo” (FUSCO, página 220).

Muitos tentaram denegrir a imagem de Paulo Barreto. Tentaram-lhe negar talento, em vista de sua arte, e também negaram-lhe a arte, em virtude de sua vida. Concluindo, Rosário Fusco pinta uma imagem de João do Rio. “Discutido, negado, calumiado, elogiado, João do Rio conseguiu transpor seu tempo. Essa é que é a verdade. E quando lemos as reportagens modernas, que os jornais de hoje publicam, entrevistando os padeiros, pescadores, o homem do realejo ou a mulher que vende bilhetes, o chauffeur de táxis ou o cambista do estribo de bonde, o gari ou o fotografo dos jardins sem flores da cidade, nem sabe o jornalista sabe que está repetindo João do Rio, que é uma ‘escola’ de João do Rio que ele está perpetuando, para argumentar a sua glória ou para compensar o descaso com que o tratamos. Descaso ou ignorância. Porque se a sua obra não vale em si, é forçoso reconhecer a influência poderosa, que até hoje progride, como causa ou como efeito de bagagem literária infinitamente menor de muita gente que anda por aí (...)” (FUSCO, página 220).

Também romancista, era a crônica que dominava com maior desenvoltura e graça, dando gênero literário a uma espécie de escrita pertinente aos profissionais dos folhetins diários. Inovador, ao mesmo tempo que original. Não precisou de ressurreição, pois como enfatiza Rosário Fusco, João do Rio está mais vivo do que nunca, inclusive mais do que os próprios vivos que lhe prestam homenagens hoje em dia.

Um comentário:

Vitor Lopes Moreira disse...

Texto novo no blog.
Dessa vez um texto com pitada de crítica literária.

O tema é sobre João do Rio, cronista e jornalista importante do início do século XX. Entre as suas obras destaca-se "A alma encantadora das ruas" e "As religiões do Rio". Vale a pena dar uma conferida. Segue postado um fichamento de um texto de Rosário Fusco, que faz uma breve análise do cronista, ressaltando sua relevância no cenário intelectual da época, e destacando a importância social de suas produções literárias.

Em relação ao primeiro livro mencionado, sei que há uma edição excelente da "Companhia de Bolso", bem barata (ao estilo lpocket book, o que é bem bacana também). Aí é com vocês, fica aqui apenas a dica.

Esse texto eu fiz ano passado, mas ou menos no mês de novembro. Resolvi postar agora pois já estava na hora de dividir com todos. Serve como um excelente guia de estudos.

Um grande abraço, continuem visitando o blog.
www.ifcsianovitor.blogspot.com
Vitor Lopes Moreira (mestrando em história/ UFRRJ)